Política

Indicação de Zanin para o STF ganha repercussão negativa nas páginas do Le Monde

03 JUN 2023

A indicação do advogado Cristiano Zanin, 47 anos, amigo dileto do presidente Lula da Silva, para o STF ganha quase uma página de repercussão negativa no jornal francês Le Monde


Em matéria assinada por Bruno Meyerfeld, o periódico lembra que Zanin defende Lula nas esferas judiciárias desde 2013. Transcreve a declaração do petista: “Vocês todos esperavam que eu o nomeasse!”.


Diz que a declaração de Lula foi feita com um sorriso maroto. Ou seja: travesso, digamos assim.


Recorda a façanha do advogado de conseguir no STF que as condenações de Lula fossem anuladas e, também, a liberdade e o direito de se candidatar nas eleições de 2022, em que foi eleito contra o presidente Jair Bolsonaro.


“Em troca, obteve a eterna gratidão de seu influente cliente. Preparada há meses pelos lulistas do primeiro círculo, a nomeação deve ser validada sem incidentes pelo Senado. O próprio presidente da instituição, Rodrigo Pacheco, julgou "positivamente" a escolha de Zanin para este importante cargo. Os membros do STF têm de fato poderes consideráveis, desde a verificação da constitucionalidade das leis até as investigações judiciais e a organização de eleições”, descreve o jornal.


Entrevistou a cientista política Camila Rocha, que considerou: “Lula tomou a pior decisão possível”.


O jornal francês atenta que a nomeação “corre o risco de ser muito mais difícil de ser difundida na opinião pública, onde a imagem de Lula e de seu Partido dos Trabalhadores continua associada a casos de corrupção”. 


E Camila Rocha diz enfática que ao indicar seu advogado pessoal para o STF, Lula “dá a impressão de querer garantir a impunidade e se resguardar de qualquer processo judicial ou retorno à prisão. É desastroso em termos de imagem, tanto entre os eleitores de extrema-direita de Jair Bolsonaro quanto entre os centristas”.


Alerta que existe uma perseguição contra os que atuaram para as condenações na Lava Jato. Cita Sérgio Moro, juiz estrela da operação, hoje senador, e o deputado Deltan Dallagnol, que teve o mandato cassado em maio sob a justificativa de irregularidades durante a campanha em 2022. 


Afirma que também existem críticas de parte da esquerda, “decepcionadas com a escolha de Cristiano Zanin”.


Pontua: “No início de março, um manifesto assinado por várias dezenas de organizações exigia a nomeação inédita de um primeiríssimo jurista, em vez de um novo homem branco, evocando “uma oportunidade única para acabar com uma lacuna reveladora do fraco dinamismo da democracia brasileira”. 


Disse Felipe Rendo, fundador do site de informações jurídicas JOTA: “Mas a lealdade é o único critério que norteou Lula em sua escolha”. Acrescenta que “Zanin é um bom advogado, mas não um constitucionalista renomado. Ideologicamente, ele não tem raízes reais na esquerda”. 


Lembra que o advogado “nunca expressou posições muito claras, por exemplo sobre a questão do aborto [ainda ilegal no Brasil]”.


O jornal leva em conta que a nomeação de Zanin no STF “representaria, no entanto, uma vitória política indiscutível para um Lula em grandes dificuldades, apenas cinco meses após a posse. Diante de um Congresso de maioria ultraconservadora, o presidente lutou para levar adiante sua política. Nos últimos dias, os parlamentares aprovaram uma série de textos que ameaçam a proteção do meio ambiente e limitam os direitos dos povos indígenas às suas terras ancestrais: uma humilhação para o autoproclamado campeão do clima Lula. O Chefe de Estado não consegue manter o controle do jogo institucional. A caminho está o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. Ex-aliado de Jair Bolsonaro, eleito por Alagoas, é puro produto do establishment, processado por corrupção e condenado no passado por emprego fictício, controla uma bancada de 173 deputados, ou seja, um terço do hemiciclo. Impossível obter a maioria sem o apoio desse político astuto, que paga caro por seu apoio: no início da semana, Lula teve que aceitar a liberação de 1,7 bilhão de reais (315 milhões de euros) de subsídios parlamentares para evitar novas derrocadas no Congresso”.


Sendo assim, Cristiano Zanin “poderia, em teoria, influenciar as principais decisões do país por quase três décadas, até 2050, antes de atingir o limite de idade. O suficiente para garantir o legado de Lula, bem depois do fim de seu mandato”.

Autor(a): Eliana Lima



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